O descontrole das paixões na desconsideração da alma

povoDiác. José Victorino de Andrade, EP

A valorização da estética humana, de maneira sensual e desregrada, fruto muitas vezes de modelos impostos pela mídia e por um egocentrismo excessivo, resulta em toda a espécie de sacrifícios físicos e de abstenções, que repugnam ao homem enquanto penitência e mortificação, próprias a uma necessidade espiritual ou a um determinado período litúrgico, mas valorizadas e muitas vezes levadas a extremos para se chegar a um determinado padrão de exigência em nossa sociedade. Tome-se como exemplo os abundantes casos de anorexia e fenômenos discriminatórios, cuja reivindicação de uma determinada aparência conotada como “bela” leva a regimes e a atitudes perigosas para o normal funcionamento do organismo humano.

Por outro lado, surge também o campo dos excessos. A desregrada satisfação dos sentidos leva a cometerem-se abusos que levam a um mero sentimento, desenfreado e vicioso, jamais satisfatório, porque o corpo parece nunca saciar-se, reflexo da insaciabilidade da alma enquanto não repousa em Deus. João Paulo II alertou os jovens a este respeito:

[…]vos encontrais no período maravilhoso e delicado, em que a vossa realidade biopsíquica cresce até à maturação perfeita para serdes capazes, física e espiritualmente, de enfrentar as alternativas da vida nas suas mais desvairadas exigências. Temperante é aquele que não abusa dos alimentos, das bebidas e dos prazeres; que não toma desmedidamente bebidas alcoólicas; que não se priva da consciência mediante uso de estupefacientes ou drogas. Em nós podemos imaginar um “eu inferior” e um “eu superior”. No nosso “eu inferior” exprime-se o nosso “corpo” com as suas carências, os seus desejos, as suas paixões de natureza sensível. A virtude da temperança garante a cada homem o domínio do “eu superior” sobre o do “inferior”. Trata-se, talvez, neste caso, de humilhação, de diminuição para o nosso corpo? Pelo contrário! Esse domínio valoriza-o, exalta-o. […]

Refleti bem nisto, vós jovens, que estais precisamente na idade em que tanto se estima ser belo ou bela para agradar aos outros! Um jovem e uma jovem devem ser belos primeiramente e sobretudo interiormente. Sem tal beleza interior, todos os outros esforços que só tenham o corpo por objeto não farão — nem dum jovem nem duma jovem — uma pessoa verdadeiramente bela.[1]

Parece que o papel de uma alma virtuosa, como fator até de beleza e atração, ficou relegada a um segundo plano, talvez reflexo de uma superficialidade que não olha para o conteúdo e para a profundidade das coisas, mas que se deixa levar por considerações e sentimentos primários, onde a inteligência é dominada pelas outras potências e a sensibilidade se torna rainha e senhora do nosso ser. Desconsidera-se que uma alma temperante e que procura a santidade tem uma beleza que lhe vem do mais profundo do seu ser, refletindo-se na própria fisionomia e temperamento, enquanto que aquela que é escrava das paixões e vive no pecado, influencia o próprio organismo, bastando observar um pouco a degradação e a fragilidade humana daqueles e daquelas que vivem na luxuria, na dependência e no vicio, inclusive com notório envelhecimento precoce e enrudecimento comportamental…

[1] João Paulo II. Encontro com os Jovens na Basílica Vaticana. 22 de Novembro de 1978


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