Mons. João Scognamiglio Clá Dias, EP
A Teologia a respeito dos fundadores é relativamente recente, pois só a partir do Concílio Vaticano II prestou-se, com maior empenho, atenção nessas manifestações surgidas às vezes até mesmo no laicato, reconhecendo sua legitimidade de uma forma genérica[1].
E deve-se ao Papa Paulo VI a menção textual a esse carisma em documento do Magistério Pontifício, no qual, ademais, confirma a presença da inspiração divina na missão dos fundadores: “Só assim podereis despertar de novo os corações para a Verdade e para o amor divino, segundo o carisma dos vossos fundadores, suscitados por Deus na sua Igreja”[2].
Posteriormente, João Paulo II usou essa expressão em diversos documentos, como, por exemplo, na Mensagem à XIV assembleia geral da Conferência dos religiosos do Brasil: “Anima-vos aquilo que é o sentido ínsito à vida consagrada: crescer no conhecimento e no amor, para serdes testemunhas e profetas de Cristo no mundo de hoje, em fidelidade dinâmica à vocação religiosa e ao carisma dos vossos fundadores”[3].
Esse carisma que anima o fundador tem a peculiaridade de poder abarcar todas as categorias de fiéis, sem distinção, quanto aos ministérios ou estados de vida, constituindo um anúncio forte da fé, o qual dá origem também a um impulso missionário[4].
Essa “inspiração fundamental” dos fundadores — Ratzinger no-la explica de forma muito clara[5] — é a identidade deles com Cristo e com o Evangelho. Fazendo um paralelismo entre a história da conversão de Santo Antão e a de São Francisco de Assis, o Pontífice afirma serem idênticos os impulsos que encontramos num e noutro: tomar o Evangelho séria e rigorosamente ao pé da letra, seguir Cristo em pobreza total e conformar toda a sua vida à dEle.
Outros autores, nas últimas décadas, aprofundaram o estudo da matéria. Trata-se de pesquisar e auscultar a presença santificante do Espírito na Igreja, Sua forma de agir e o modo de transmitir esse verdadeiro tesouro espiritual, de um movimento ou família religiosa, que é o carisma fundacional.
Tanto mais que esse dom é difícil de ser expresso na sua totalidade, em termos humanos, em doutrinas e regras. Como definir e diferenciar, por exemplo, o carisma franciscano do dominicano? Ambos são mendicantes, ambos dedicam-se à evangelização. No entanto, apesar de semelhantes, bem se pode aplicar a eles o dito de São Paulo: “uma é a claridade do sol, outra a claridade da lua e outra a claridade das estrelas, e ainda uma estrela difere da outra na claridade”[6].
A fundação, pois, baseia-se numa forma radical e peculiar de viver o Evangelho em sua totalidade, com uma sólida e profunda formação cristã, que se transmite por um método pedagógico específico, segundo o carisma de cada movimento.
[1] Cf AA, n. 3.
[2] Paulo VI, Exortação Apostólica Evangelica Testificatio, n. 11, 29/6/1971. “Solum hoc modo animos hominum ad veritatem amoremque divinum amplectendum erigere poteritis secundum charisma Fundatorum vestrorum, quos Deus in Ecclesia sua excitavit”.
[3] João Paulo II, Mensagem aos participantes da XIV Assembleia Geral da Conferência dos religiosos do Brasil, 11/7/1986. “Il vostro scopo è di crescere nella conoscenza e nell’amore per essere testimoni e profeti di Cristo nel mondo d’oggi, in fedeltà dinamica alla vocazione religiosa e al carisma dei vostri fondatori”.
[4] Cf Id., Mensagem aos participantes do Congresso Mundial dos Movimentos Eclesiais, 27/5/1998.
[5] Cf J. Ratzinger, Os Movimentos na Igreja, presença do Espírito e esperança para os homens. São João de Estoril 2007, p. 45.
[6] I Cor 15, 41.