Mons. João S. Clá Dias, EP
A entrada de Paulo na comunidade cristã impulsionou o caráter universal da Igreja. Investido de um especial carisma para levar a boa nova do Evangelho às nações pagãs, alargou os limites da Igreja, como ele mesmo testifica: “viram que a evangelização dos incircuncisos me era confiada, como a dos circuncisos a Pedro (porque aquele cuja ação fez de Pedro o apóstolo dos circuncisos, fez também de mim o dos pagãos)” (Gl 2, 7-8).
O Espírito foi inspirando, dessa forma, os mártires e as virgens, os monges e os missionários, os doutores e confessores da fé. No século terceiro apareceu o monacato, com Santo Antão Abade e São Basílio. No século quinto o Espírito suscitou o grande Santo Agostinho. Mais tarde, o patriarca São Bento deu origem a um dos maiores movimentos de espiritualidade surgidos na era cristã, verdadeiro sopro de renovação que atingiu o ocidente.
O essencial da obra de Bento de Núrsia consistiu em fermentar uma sociedade cindida por revoltas, crises e guerras, transformando-a, aos poucos, na era “em que a filosofia do Evangelho governou os Estados ”. “No grande eclipse da civilização antiga que sobreveio no tempo das invasões, apenas permaneceu outra luz, excetuando o florescente império visigótico, que aquela que teve de se refugiar na brilhante constelação de mosteiros espalhados pela França e os países setentrionais, especialmente na remota Irlanda. Os monges foram os transmissores do saber antigo para os séculos futuros ”.
No século sexto o monacato se enriqueceu, com São Gregório Magno, de um caráter missionário, incorporando os povos germânicos à Igreja e estabelecendo as bases da Europa cristã. Assim se exprime Colombás (1998, p. 362):
Os antigos mosteiros, e mesmo os solitários independentes, desenvolveram, pela própria força das coisas, uma ampla atividade apostólica, no comum dos casos não sacramental nem ministerial, mas puramente espiritual. Isto é, os monges atuaram não em qualidade de clérigos, senão de “homens de Deus”. Sua ação emanava de sua espiritualidade. Impulsava-os a necessidade das almas, quando não a vontade dos bispos.
No século nono os monges Cirilo e Metódio levaram a palavra evangélica ao mundo eslavo, e no século décimo a reforma monástica de Cluny, iniciada pelo abade São Bernon e continuada com êxito por seus quatro sucessores, entre os quais destaca-se Santo Odilon, deu origem ao movimento devocional e renovador que configurou definitivamente a idéia de Europa e de cujo dinamismo brotou, no século XI, São Gregório VII e a denominada reforma gregoriana.
A verdadeira vantagem de Cluny vem, portanto, de haver tido à sua cabeça, sobretudo nos primeiros cem anos, homens excepcionais por sua têmpera, cultura, intuito organizador e político e, sobretudo, dotados de um carisma espiritual arrebatador.
Pode-se dizer que o esplendor dessa época, deveu-se, em grande parte, à influência da ação benéfica surgida dos claustros. Os grandes vôos da ordem temporal tiveram sua raiz nesses movimentos soprados pela graça no seio da Igreja, já que a missão destes não se limitava apenas ao empenho pela santificação de seus membros, mas estendia-se para o resto da sociedade, visando à sua sacralização.
Não é possível fechar os olhos à ação benfazeja que exercem [os monges] universalmente não só nos mosteiros de todo o Ocidente, mas nas cortes dos reis e dos papas, nos palácios dos bispos e nos castelos dos nobres. Eles põem em todas partes o levedo evangélico, que, cedo ou tarde, fermenta e produz frutos de santidade, de espiritualidade, de reforma dos costumes (LLORCA et at. 2003, p. 243).