A Metafísica: para quê?

Diác. Felipe Ramos, EP

Metafísica é considerada por São Tomás de Aquino como a filosofia prima, porque todas as ciências tomam seus princípios como fundamento para qualquer ulterior investigação. Mas, ao mesmo tempo, é considerada o cume de todo o esforço filosófico porque trata das coisas divinas e das causas altíssimas. Não é por menos que a Congregação para a Educação Católica tenha insistido recentemente em seu Decreto de Reforma dos Estudos Eclesiásticos de Filosofia, a respeito do papel da metafísica para superação da crise atual da filosofia e buscar algo de absoluto e que serve de fundamento.

A Metafísica, ao oferecer uma visão ampla das realidades, propõe aquilo que nenhuma riqueza pode comprar: a Sabedoria, a qual “sabe e conhece todas as coisas. Ela me guiará prudentemente em minhas ações e me protegerá com a glória dela”. (Sb 9, 11). Em suma, a sabedoria tende a considerar tudo na contemplação do divino pela penetração dos mistérios mais profundos e assim poder manifestar aos demais.

Sob essa perspectiva, a Metafísica longe de ser um conjunto de elucubrações fantasiosas, é a ciência mais importante de todas porque não visa as realidades particulares, mas a totalidade. Mas então, a Metafísica para que serviria propriamente?

Decerto como fundamento para aquela busca de Verdade que brota no interior de todos os homens…

A abertura a Deus como problema do senso e senso do problema em Juan Alfaro

Pe. François Bandet, EP

Na sua reflexão, Alfaro parte da experiência real do homem no próprio ato de existir. O que sou eu? Coisa que o homem se interroga a si mesmo e em cujo ato ele deve também tomar posição a seu respeito, enfrentando um problema que o estimula a procurar uma resposta. Não se trata de uma pergunta meramente teórica, mas conseqüentemente prática porque coloca em questão a sua liberdade.

No indagar a possível resposta a tal questão, qualquer um rende-se à evidência de não ser plenamente ele próprio, que é chamado a construir-se, a ser mais ele próprio através do liame com os outros. O paradoxo do homem de ser ele próprio, não podendo ao mesmo tempo ser plenamente ele próprio, faz do homem um mistério somente a ele próprio.

O homem toma também conta de não existir desde sempre e para sempre. De onde a revelação da limitação da experiência humana. A experiência de não vir ao mundo por ele próprio e de ter recebido uma existência não optada, resulta necessariamente na dúvida: “De onde venho? Porque vivo?”.[1] A morte faz que o momento transitório da nossa existência seja irreversível e irrepetível. Inicialmente é melhor formular a pergunta de um modo mais simples: “Vale a pena viver? A vida merece ser tomada a sério?”

Neste sentido, a fórmula de Kant permanece sempre muito atual: “O que posso saber, o que devo fazer, o que me é permitido esperar?”.[2] Trata-se de três aspectos de uma mesma questão: “O que é o homem?”.[3]

O homem é permanentemente projetado ao porvir esperado, mesmo posta qualquer outra meta em acréscimo.

O homem é livre e empenha a própria liberdade na decisão concreta que não pode realizar e levar ao fim sem interrogar-se o porquê disto. O porquê de toda a opção leva a que observe por si a questão do sentido último da existência humana. Em tal perspectiva, a questão do sentido último da vida toma um caráter transcendental. O homem poderá tomar o sentido da própria vida em apenas um ato que envolve toda a sua pessoa. Não basta o puramente contemplativo “conhece-te a ti mesmo”; é preciso o “constrói-te” a ti mesmo na autenticidade.[4] O homem pode ser definido como o criador da linguagem, da técnica, da cultura, da história etc. Porém, a característica mais evidente do ser humano é o fato que ele tem como destino procurar o sentido último da sua vida: “O homem foi posto no mundo à procura de si mesmo e do seu fim”.[5]

Segundo Alfaro, o problema do sentido último da vida transcende o campo do empiricamente verificável e, portanto, supera a competência da ciência. Isto quer dizer que o problema do sentido último implica que a resposta não possa ser evidente. Se fosse evidente, de fato, o homem não seria livre. Uma demonstração evidente do sentido último da vida permanece, por enquanto, excluída. Pode-se, em vez disso, fazer não tanto uma demonstração mas uma exposição, isto é, uma compreensão dos motivos, suficiente para justificar a opção, pois uma demonstração da evidência não deixaria a possibilidade da opção.

Posto isto, agora, onde se pode chegar, de onde se deve partir e como se deve proceder? Alfaro diz que se pode chegar à compreensão da resposta a dar ao problema do sentido da vida humana.[6] Por esse motivo, precisa saber de onde se deve partir; o ponto de partida será a esperança, e em concreto, a experiência essencial que é a experiência que o homem vive no ato de existir: a experiência do mundo, da morte e da história. Partir da experiência humana total é de importância decisiva para a reflexão sobre o problema do sentido da vida.

Uma vez assumido como ponto de partida a experiência humana total, o passo seguinte terá caráter fenomenológico: A realidade “aparece” no fenômeno, que é o apontamento do seu “mostrar-se” originário. O Homem, desta forma, não pode contentar-se a viver e experimentar, renunciando a entender a realidade. Então, após a análise formal do problema do sentido da vida humana, será necessário entrar na discussão sobre se a vida tem ou não sentido.

O método que Alfaro segue é o seguinte:

a) Existencial: o ponto de partida é a realidade do homem;

b) Fenomenológico: Faz que a pergunta nasça da realidade completa e parte de um método que leva em consideração o ser numa situação concreta;

c) Transcendental: Procura a razão profunda que transcende o fenômeno e a existência.[7]

Dado que o homem não tem uma experiência imediata de Deus, deve aceitar que o problema de Deus será possível apenas enquanto experiência da qual nasce o problema do homem que culmina pela sua natureza em qualquer coisa que é outro homem, o mundo e a história. Para Alfaro isto significa então que o problema de Deus poderá surgir apenas enquanto conexo ao problema do homem.

É preciso dizer que se o homem não fosse constitutivamente aberto ao transcendente, não se poderia sequer se aproximar de Deus. O problema de Deus é correlato ao problema do homem.

Se não é possível dar ao problema do homem uma resposta “demonstrativa”, mas apenas “mostrativa”, analogamente seria impossível dar uma resposta “demonstrativa” ao problema de Deus.[8]


[1] Idem, ibidem, p. 12-13.

[2] Cf. KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura (Kritik der reinen Vernunft).

[3] ALFARO, Juan. Dal problema dell’uomo al problema di Dio (1988), Queriniana, Brescia, 1991, p. 26.

[4] Idem, ibidem, p. 17.

[5] Idem, ibidem.

[6] Cf. Idem, ibidem, p. 19.

[7] Idem, ibidem, p. 21.

[8] Idem, ibidem., p. 23.