Vocação Universal à Santidade

Pe. José Victorino de Andrade, EP

A comum vocação de todos os homens à santidade, seja qual for o seu estado, é atestada pelo Catecismo da Igreja Católica1 e por numerosos documentos do Concílio Vaticano II.2 Conforme Bento XVI: “No contexto da vocação universal à santidade (cf. 1 Ts 4, 3) encontra-se a vocação especial para a qual Deus exorta todos os indivíduos”.3 A Constituição Dogmática Lumen Gentium dedica-lhe um capítulo inteiro,4 exortando o cristão a ser exemplo para todo o próximo na medida em que, praticando os conselhos evangélicos, edifica toda a sociedade.

Se bem que todos os homens sejam convidados à santidade, alguns o são de modo muito especial, sobretudo enquanto chamados a dar exemplo, pois pela própria perfeição estão chamados a aperfeiçoar os demais. São Tomás salienta entre estes, sobretudo, os bispos e aqueles que levam vida religiosa, pois abdicam de certos bens terrenos, que poderiam usufruir livremente, para se dedicarem de modo mais integral e livre ao serviço de Deus.5

A Constituição Dogmática Lumen Gentium6 hierarquiza-os deste modo:

1. Os Bispos, que devem fazer do seu ministério “um sublime meio de santificação” a fim de serem “modelos do rebanho” (cf. 1 Ped. 5, 3) e com o seu exemplo suscitarem na Igreja “uma santidade cada vez maior”.

2. Os presbíteros, à semelhança da ordem dos Bispos e sempre em fiel e generosa cooperação, para que crescendo no amor de Deus e do próximo sigam aqueles que “nos deixaram magnífico exemplo de santidade” a fim de alimentar e afervorar a sua ação “para alegria de toda a Igreja de Deus”.

3. Os diáconos, atendendo “a toda a espécie de boas obras diante dos homens” (cf. 1 Tim 3, 8-10. 12-13) e fazendo tudo para glória e honra de Deus. Aqui se incluem também todos aqueles que são chamados ao cumprimento de algum ministério para que, consagrando-se às atividades apostólicas, dêem fruto em abundância.

4. Os esposos e pais cristãos para que, na fidelidade mútua e imbuídos da doutrina cristã e das virtudes evangélicas eduquem a prole que amorosamente receberam de Deus dando “exemplo de amor incansável e generoso” e edificando a comunidade.

Por fim, incluem-se todos os fiéis, sejam quais forem as condições, tarefas ou circunstâncias de seu estado para, através de todas elas, “receberem tudo com fé da mão do Pai celeste e cooperarem com a divina vontade, manifestando a todos, na própria atividade temporal, a caridade com que Deus amou o mundo”.7

1) Ver, por exemplo, n. 941, 1533, 2013.

2) Entre outros: Lumen Gentium, n. 32; Gaudium et Spes, n. 34 ; Gravissimum Educationis, n. 2; Presbyterorum Ordinis, n. 2.

3) Visita Ad Limina Apostolorum dos Bispos do Canadá – Atlântico. 20 mai. 2006.

4) Capítulo V: A Vocação de todos à santidade na Igreja.

5) Cf. Sum. Theol. II-II Q. 184, a. 5.

6) Cf. Lumen Gentium, n. 41

7) Idem.

A eficácia do ministério sacerdotal

Mons. João S. Clá Dias, EP

A santidade de vida do sacerdote, como exemplo para os fiéis de Cristo, é possante elemento para conduzi-los à perfeição. Bem ressalta Dom Chautard que a um sacerdote santo corresponde um povo fervoroso; a um sacerdote fervoroso, um povo piedoso; a um sacerdote piedoso, um povo honesto; a um sacerdote honesto, um povo ímpio.[1] Grande é, pois, o papel da virtude do ministro, para o êxito de seu ministério.

No que respeita à aplicação do valor da Santa Missa, com finalidade propiciatória, é que se pode falar de sua eficácia subjetiva, dependente das disposições de quem a celebra e daqueles aos quais ela é aplicada, como explica São Tomás:

“Na satisfação atende-se mais à disposição de quem oferece do que à quantidade da oferenda. Por isso, o Senhor observou, a respeito da viúva que oferecia duas moedinhas, que ela ‘depositou mais que todos os outros’. Ainda que a oferenda da Eucaristia, quanto à sua quantidade, seja suficiente para satisfazer por toda a pena, contudo ela tem valor de satisfação para quem ela é oferecida ou para quem a oferece, conforme a medida de sua devoção, e não pela pena inteira”.[2]

A respeito deste trecho do Doutor Angélico, Robert Raulin faz o seguinte comentário: “Seria perniciosa ilusão acreditar que o ofertante está dispensado do fervor, sob pretexto de que Cristo, oferecendo-Se na Missa, satisfez plenamente por todos os pecados do mundo”.[3]

Outro argumento, ainda, apresenta o Aquinate, para vincular a eficácia da Eucaristia à devoção dos que se beneficiam do valor infinito deste augusto Sacramento:

“A Paixão de Cristo traz proveito a todos para a remissão da culpa, a obtenção da graça e da glória, mas o efeito só é produzido naqueles que se unem à Paixão de Cristo pela fé e caridade. Assim, também este Sacrifício, que é o memorial da Paixão do Senhor, só produz efeito naqueles que se unem a este Sacramento pela fé e caridade. […] Aproveitam, no entanto, mais ou menos, segundo a medida de sua devoção”.[4]

A especial obrigação dos sacerdotes em trilhar o caminho da santidade é reafirmada no decreto Presbyterorum ordinis: “Estão, porém, obrigados por especial razão, a buscar essa mesma perfeição visto que, consagrados de modo particular a Deus pela recepção da Ordem, se tornaram instrumentos vivos do sacerdócio eterno de Cristo”.[5] E de seu aperfeiçoamento pessoal, ensina o mencionado documento conciliar, decorrerá maior ou menor abundância de frutos de sua ação pastoral:

“A santidade dos presbíteros muito concorre para o desempenho frutuoso do seu ministério; ainda que a graça de Deus possa realizar a obra da salvação por ministros indignos, todavia, por lei ordinária, prefere Deus manifestar as suas maravilhas por meio daqueles que, dóceis ao impulso e direção do Espírito Santo, pela sua íntima união com Cristo e santidade de vida, podem dizer com o Apóstolo: ‘Se vivo, já não sou eu, é Cristo que vive em mim’” (Gl 2, 20).[6]

Ante esta realidade, o sacerdote tem dois grandes deveres. Um para consigo mesmo e outro para com o povo, pois ambos se beneficiam dos frutos da Santa Missa, especialmente o celebrante, conforme o grau de fervor ou devoção.[7]

Segundo alguns teólogos, este fruto especialíssimo da Santa Missa, destinado ao sacerdote, é maior do que o destinado aos demais participantes do Sacrifício Eucarístico, ou àqueles aos quais se aplica o seu valor. É neste manancial inesgotável da misericórdia de Deus que cada ministro ordenado deve ir buscar as melhores graças para a sua santificação, assim como a daqueles que lhe estão confiados:

“Por causa do poder do Espírito Santo, que pela unidade da caridade comunica os bens dos membros de Cristo entre si, acontece que o bem particular presente na Missa de um bom sacerdote se torna frutuoso para outras pessoas”.[8]

Dessa maneira, corresponderá ele à altíssima dignidade de seu ministério, segundo dizia o Santo Cura d’Ars:

“Sem o sacramento da Ordem, não teríamos o Senhor. Quem O colocou ali naquele sacrário? O sacerdote. Quem acolheu a vossa alma no primeiro momento do ingresso na vida? O sacerdote. Quem a alimenta para lhe dar a força de realizar a sua peregrinação? O sacerdote. Quem há de prepará-la para comparecer diante de Deus, lavando-a pela última vez no sangue de Jesus Cristo? O sacerdote, sempre o sacerdote. E se esta alma chega a morrer [pelo pecado], quem a ressuscitará, quem lhe restituirá a serenidade e a paz? Ainda o sacerdote. […] Depois de Deus, o sacerdote é tudo! […] Ele próprio não se entenderá bem a si mesmo, senão no Céu”.[9]


[1] Cf. CHAUTARD, OCSO, Jean-Baptiste. A Alma de todo o apostolado. Porto: Civilização, 2001, p. 34-35.

[2] S Th III, q. 79, a. 5, Resp.

[3] In: AQUINO, São Tomás de. Suma Teológica. São Paulo: Loyola, 2006, v. 9, p. 358.

[4] S Th III q. 79, a. 7, ad 2.

[5] PO, n. 12.

[6] Idem.

[7] Cf. ROYO MARÍN, OP, Antonio. Teología Moral para Seglares. Madrid: BAC, 1994, v. 2, p. 158.

[8] S Th III q. 82, a. 6, ad 3.

[9] Palavras de São João Maria Vianney, citadas pelo Papa Bento XVI na Carta para Proclamação do Ano Sacerdotal, 16 jun. 2009.

A vocação de Santa Teresinha nos seus manuscritos

Pe. Alex Barbosa Brito, EPsta-teresinha

Ao analisarmos os Manuscritos foram encontrados diversos trechos em que aparece o termo Santidade e o seu correlato: a Perfeição. Através de tais excertos, pudemos depreender qual o conceito que a autora possui a tal respeito, bem como as diversas idéias que se entrelaçam com esta temática.

No primeiro trecho, vemos como Santa Teresinha, pergunta-se a si mesma porque todas as almas não recebiam igual medida de graças. Admira-se ela de vê-lo prodigalizar favores extraordinários a santos que o tinham ofendido, como São Paulo, Santo Agostinho, e aos quais forçava, por assim dizer, a receberem suas graças. Por outro lado, nossa santa contempla outros que eram acariciados por Nosso Senhor deste o berço até o túmulo, sem lhes deixar no caminho o menor tropeço que os tolhesse de se levantarem até Ele, predispondo essas almas com tantos favores, a ponto de não empanarem o brilho imaculado de sua veste batismal. Diante disto, questiona-se a respeito do fato de os pobres selvagens, por exemplo, morrerem em grande número, antes mesmo de ouvir pronunciar o nome de Deus.

Levando em consideração esta questão, tal Doutora da Igreja assevera que foi o próprio Jesus que lhe desvendou este mistério, pondo-lhe diante dos olhos o livro da natureza, através do qual ela compreendeu que todas as flores por Ele criadas são formosas, que o esplendor da rosa e a brancura do lírio não eliminam a fragrância da violetinha, nem a encantadora simplicidade da bonina, entendendo, desta maneira, que se todas as pequenas flores quisessem ser rosas, perderia a natureza sua gala primaveril (MENINO JESUS, 2003). De tal figura tira o seguinte ensinamento para a vida espiritual:

Outro tanto acontece no mundo das almas, que é o jardim de Jesus. Quis Ele criar os grandes Santos que podem comparar-se aos lírios, e às rosas; mas criou também os mais pequenos (sic), e estes devem contentar-se em serem boninas ou violetas, cujo destino é deleitar os olhos do Bom Deus, quando as humilha debaixo de seus pés. Consiste a perfeição em fazer sua vontade, em ser o que Ele quer que sejamos… (MENINO JESUS, 2003: 26-27, grifo nosso).

Como observamos no trecho acima, o que há de relevante para aquele que busca a perfeição, é a total conformidade com a vontade de Deus e, conseqüentemente a total fidelidade aos desígnios a seu respeito. É a essa realidade que alude Santa Teresinha no trecho supracitado, no qual percebemos na autora uma consciência muito clara da diversidade de vias para as quais os homens são chamados.

No segundo excerto selecionado, Santa Teresinha conta um fato de sua infância, no qual Leônia, sua irmã, procurou-a e sua outra irmã, Celina, com uma cesta cheia de vestidos e lindos retalhos, oferecendo-lhes tudo. Esta tomou um pacotinho de cordões. Nossa Santa, após uma curta reflexão, declarou: – Escolho tudo! Apoderando-se da cesta sem nenhuma formalidade (MENINO JESUS, 2003).

A respeito deste fato, tece a seguinte consideração:

“E compreendi que para se tornar santa era preciso sofrer muito, ir sempre atrás do mais perfeito e esquecer-se a si mesmo [sic]. Compreendi que na perfeição havia muitos graus e que cada alma era livre no responder às solicitações de Nosso Senhor, no fazer muito ou pouco por Ele, numa palavra, no escolher entre os sacrifícios que exige. Então, como nos dias de minha primeira infância, exclamei: “Meu Deus, escolho tudo”. Não quero ser santa pela metade. Não me faz medo sofrer por vós, a única coisa que me dá receio é a de ficar com minha vontade. Tomai-a vós, pois “escolho tudo” o que vós quiserdes!…” (MENINO JESUS, 2003: 42)

No terceiro trecho a ser considerado, Santa Teresinha comenta como era a formação que, nos tempos de infância, recebia de sua irmã Maria, a qual lhe explicava a importância de não deixar passar nenhuma oportunidade sem procurar juntar as riquezas celestes, dando a entender a grande infelicidade daqueles que nem querem se dar ao trabalho de estender a mão para as agarrar, deixando-as passar ao largo. Desse modo, consoante deixa explícito, sua irmã lhe ensinava a fidelidade nas mínimas coisas (MENINO JESUS, 2003).

Nossa Santa elogia a eloqüência de Maria, imaginando em sua pueril inocência que, se os pecadores mais empedernidos a ouvissem, converter-se-iam (MENINO JESUS, 2003).

Conta, também, neste excerto, um fato que se deu em sua minoridade, no qual uma de suas mestras da Abadia lhe perguntou o que fazia nos dias de folga quando estava sozinha. Teresinha respondeu-lhe que se punha atrás de sua cama, num vão que ali havia, fácil de se fechar com o cortinado, ficando a “pensar”. Sua professora, então, lhe perguntou no que pensava, ao que ela respondeu que cogitava em Deus, na vida, na eternidade… Afinal, que pensava… Muito se divertindo tal religiosa à sua custa (MENINO JESUS, 2003). Sobre este episódio, acrescenta nossa Santa: “Compreendo agora que, sem o saber fazia oração, e que o bom Deus já me instruía em segredo”. (MENINO JESUS, 2003: 89)

No quarto trecho, Santa Teresinha manifesta que foi sempre seu grande desejo ser santa, entristecendo-se pelo fato de a distância que havia entre os Santos e ela poder se comparar à que existe entre uma montanha e um grão de areia, espezinhado pelos transeuntes (MENINO JESUS, 2003).

Ao invés de desanimar, argumenta que o Bom Deus não seria capaz de inspirar-lhe desejos irrealizáveis, não sendo sua pequenez um obstáculo (MENINO JESUS, 2003).

Deste modo, nossa Santa procura um meio de ir para o céu por uma trilha bem reta, bem curta e inteiramente nova. Assim, introduz a figura do elevador, que, naquele tempo, acabara de ser inventado, afirmando que gostaria de encontrar um elevador para se reerguer até Jesus, buscando nos Sagrados Livros uma indicação do objeto de seus desejos. Com efeito, encontra neles as seguintes palavras: “Se alguém é pequenino, venha a mim” contidas no capítulo 94 do livro dos Provérbios, indo com o pressentimento de haver achado o que procurava, com a vontade de saber o que Deus faria a um pequenino que respondesse ao Seu chamado (MENINO JESUS, 2003). Continuando suas reflexões, encontra o seguinte trecho no mesmo capítulo aludido acima: “Como uma mãe acaricia o filhinho, assim vos consolarei, e vos acalentarei em meu regaço” (MENINO JESUS, 2003), a respeito do que faz a seguinte exclamação: “Oh! nunca vieram alegrar minha alma palavras mais ternas e mais melodiosas! O elevador que me conduzirá até ao céu, são vossos braços, ó Jesus! Por isso, não preciso ficar grande. Devo, pelo contrário, conservar-me pequenina, que venha a ser sempre mais”. (MENINO JESUS, 2003: 226-227)

O quinto e último excerto é o mais sublime de todos, pois é nele que Teresinha explicita a sua vocação à Santidade.

Ela inicia tal pensamento da seguinte maneira: “Ser tua esposa, ó Jesus, ser carmelita, ser mãe das almas pela união contigo, deveria ser bastante para mim… Mas assim não acontece… Sem dúvida, as três prerrogativas constituem exatamente minha vocação: Carmelita, Esposa, e Mãe” (MENINO JESUS, 2003: 211).

Depois do que afirma sentir em si outras vocações:

“Sinto em mim a vocação de GUERREIRO, de SACERDOTE, de APÓSTOLO, de DOUTOR, e de MÁRTIR. Sinto, afinal, a necessidade, o desejo de realizar por ti, Jesus, todas as obras, as mais heróicas… Sinto na alma a coragem de um Cruzado, de Zuavo Pontifício. Desejaria morrer no campo de batalha pela defesa da Igreja…[…]” (MENINO JESUS, 2003: 211).

Como seus desejos a martirizavam, abriu as epístolas de São Paulo, dando com os olhos nos capítulos 12 e 13 da primeira aos Coríntios. Comenta que leu no primeiro deles que nem todos podem ser apóstolos, profetas, doutores, etc e que a Igreja se compõe de membros diversos, de modo que o olho não pode ser mão ao mesmo tempo.

Dando continuação esta leitura, deparou-se com uma passagem na qual o Apóstolo convida seus destinatários a buscar os dons maiores, mostrando que os mais perfeitos não são nada sem o Amor, o qual é o caminho por excelência, que leva a Deus com segurança. (MENINO JESUS, 2003). Ao que acrescenta que

“a resposta era clara, mas não satisfazia os meus anseios, não me dava paz… Como Madalena insistia em debruçar-se sobre o túmulo vazio e acabou encontrando o que procurava, assim também, debruçando-me até as profundezas do meu nada, ergui-me a tal altura, que pude alcançar o meu objetivo… A resposta era clara, mas não satisfazia os meus anseios, não me dava paz… Encontrara, enfim, tranqüilidade… Tomando em consideração o corpo místico da Igreja, não me identificava em nenhum dos membros descritos por São Paulo, por outra, queria identificar-me em todos eles. A caridade deu a chave de minha vocação. […] Compreendi que o AMOR ABRANGE TODAS AS VOCAÇÕES, ALCANÇANDO TODOS OS TEMPOS E TODOS OS LUGARES… NUMA PALAVRA, É ETERNO…” (MENINO JESUS, 2003: 213).

E, para concluir tal raciocínio, faz de uma maneira vibrante e entusiasmada, a seguinte assertiva: “Então, no transporte de minha delirante alegria, pus-me a exclamar: Ó Jesus, meu amor, minha vocação, encontrei-a afinal: MINHA VOCAÇÀO É O AMOR!….” (MENINO JESUS, 2003: 214)

Considerando o que acima foi explicitado nós podemos concluir, de acordo com o pensamento da Doutora da Igreja aqui focalizado:

1) Que a santidade consiste antes de tudo em estar disposto por completo a fazer a vontade de Deus.

2) Que para tanto se faz necessário o sofrimento.

3) Que os meios para obter a santidade são a oração e a fidelidade nas pequenas coisas.

4) Que se faz necessário deixar-se levar, sem impor obstáculos, por esse Divino Elevador, que é Jesus Cristo, através da compenetração da própria fragilidade, da confiança, e da completa fidelidade às suas luzes e graças.

5) Que a vocação específica de Santa Teresinha é o Amor.

A proposta de santidade impele à perfeição na caridade

Pe. José Victorino de Andrade, EP

“Sede perfeitos como vosso Pai do Céu é perfeito” (Mt 5, 48). Para São Tomás de Aquino, esta proposta que Nosso Senhor nos faz na sequência do Sermão das Bem-Aventuranças não pode ser inatingível pelo homem, pois neste caso jamais lhe poderia ser prescrito.[1] Portanto, tem de ser possível chegar à perfeição nesta vida, e esta consiste, de acordo com Santo Agostinho, na ausência dos desejos desordenados que se opõem à caridade. O Aquinense acrescenta a esta doutrina tudo quanto possa impedir que o afecto da mente se dirija totalmente a Deus, sem o que não poderá haver caridade, que é a perfeição da vida cristã.[2]

O Catecismo da Igreja Católica aclara esta questão:

O exercício de todas as virtudes é animado e inspirado pela caridade, que é o ‘vínculo da perfeição’ (Cl 3,14); é a forma das virtudes, articulando-as e ordenando-as entre si; é fonte e termo de sua prática cristã. A caridade assegura e purifica nossa capacidade humana de amar, elevando-a à perfeição sobrenatural do amor divino (n. 1827).

Embora alguns autores prefiram distinguir o convite à perfeição da vocação relativamente à santidade, os termos se interpenetram na medida em que a perfeição pode e deve ser um notável caminho para a santificação.[3] De acordo com São Paulo (Cl 1, 28), é a perfeição em Cristo que os homens devem almejar para se apresentar diante de Deus e dos demais. A Lumen Gentium recorda que “todos os fiéis, seja qual for o seu estado ou classe, são chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade” (n. 40), ou seja, à santidade.

Esta comum vocação de todos os homens à santidade, seja qual for o seu estado, é atestada pelo Catecismo da Igreja Católica[4] e por numerosos documentos do Concílio Vaticano II.[5] Conforme Bento XVI: “No contexto da vocação universal à santidade (I Ts 4, 3) encontra-se a vocação especial para a qual Deus exorta todos os indivíduos”.[6]

A Constituição Dogmática Lumen Gentium dedica-lhe um capítulo inteiro,[7] exortando o cristão a ser exemplo para todo o próximo na medida em que, praticando os conselhos evangélicos, edifica toda a sociedade:

A prática destes conselhos, abraçada sob a moção do Espírito Santo por muitos cristãos, quer privadamente quer nas condições ou estados aprovados pela Igreja, leva e deve levar ao mundo um admirável testemunho e exemplo desta santidade (n. 39).

E que maior caridade poderá haver do que aquela que se manifesta na santidade? Esta é a verdadeira caridade, que permanecerá sempre, conforme nos explica o Papa Bento XVI na sua encíclica, caridade na verdade. Por isso afirmava já São Tomás: “Quem vive na caridade, participa em todo o bem que se faz no mundo”,[8] e ainda: “O ato de um realiza-se mediante a caridade do outro, daquela caridade por meio da qual todos nós somos um só em Cristo”.[9]


[1] Cf. S. Th. II-II Q. 184, a. 2.

[2] Loc. Cit.

[3] Ver a este respeito NETTO DE OLIVEIRA, José. Perfeição ou Santidade e outros textos espirituais. 2ª ed. São Paulo: Loyola, 2002.

[4] Ver, por exemplo, n. 941, 1533, 2013.

[5] Entre outros: Lumen Gentium, n. 32; Gaudium et Spes, n. 34 ; Gravissimum Educationis, n. 2; Presbyterorum Ordinis, n. 2.

[6] Visita Ad Limina Apostolorum dos Bispos do Canadá – Atlântico. 20 mai. 2006. Disponível em : <www.vatican.va>.

[7] Capítulo V: A Vocação de todos à santidade na Igreja.

[8] Symb. Apost.

[9] IV Sent. d. 20, a. 2; q. 3 ad 1.

O chamado à perfeição

vaticanoDiác. José Victorino de Andrade, EP

“Sede perfeitos como vosso Pai do Céu é perfeito” (Mt 5, 48). Para São Tomás de Aquino, esta proposta que Nosso Senhor nos faz na sequência do Sermão das Bem-Aventuranças não pode ser inatingível pelo homem, pois neste caso jamais lhe poderia ser prescrito pela lei divina.[1] Portanto, tem de ser possível chegar à perfeição nesta vida, e esta consiste, de acordo com Santo Agostinho, na ausência dos desejos desordenados que se opõem à caridade. O Aquinate acrescenta a esta doutrina tudo quanto possa impedir que o afeto da mente se dirija totalmente a Deus, sem o que não poderá haver caridade, que é a perfeição da vida cristã.[2] O Catecismo da Igreja Católica aclara esta questão:

O exercício de todas as virtudes é animado e inspirado pela caridade, que é o “vínculo da perfeição” (Cl 3,14); é a forma das virtudes, articulando-as e ordenando-as entre si; é fonte e termo de sua prática cristã. A caridade assegura e purifica nossa capacidade humana de amar, elevando-a à perfeição sobrenatural do amor divino.[3]

 

Embora alguns autores prefiram distinguir o convite à perfeição da vocação à santidade, os termos se interpenetram na medida em que a perfeição pode e deve ser um notável caminho para a santificação.[4] De acordo com São Paulo (cf. Cl 1, 28), é a perfeição em Cristo que os homens devem almejar para se apresentar diante de Deus. O próprio Concílio recordou que “todos os fiéis, seja qual for o seu estado ou classe, são chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade”,[5] ou seja, à santidade.

A aliança estabelecida por Deus com os homens trouxe-lhes, já no Antigo Testamento, um forte apelo à santidade, na medida em que cumprissem os preceitos por Ele estabelecidos. Mais do que os ritos prescritos,[6] este convite abrangia as variadas dimensões morais do Povo Eleito, manifestando-se, por exemplo, quando o Senhor fala pela boca de Isaías e se revela adverso em relação ao culto prestado por aqueles cuja malícia está em seu coração, e exorta a uma purificação, a fim de os homens se voltarem para a caridade e a justiça (cf. Is 1, 15-17). Assim, através de uma vida coerente com a Lei e o culto, Deus, só Ele Santo, deseja comunicar a sua santidade ao povo que cumpre Suas exigências e formar uma nação santa (cf. Ex 19,6).

Pedro, em sua Primeira Epístola, recordará este chamado à santidade (cf. I Pd 1, 15-16) retomando-o e dotando-o de uma nova perspectiva, iluminada pela Redenção, exortando assim a uma peregrinação terrena configurada com Cristo e conformada ao caráter soteriológico de sua encarnação.

VICTORINO DE ANDRADE, José. Editorial. in: Revista Lumen Veritatis. São Paulo: Associação Colégio Arautos do Evangelho. n.8, jul-set 2009, p. 3-5.

[1] Cf. Sum. Theol. II-II Q. 184, a. 2.

[2] Idem.

[3] Catecismo da Igreja Católica n. 1827.

[4] Ver a este respeito NETTO DE OLIVEIRA, José. Perfeição ou Santidade e outros textos espirituais. 2ª ed. São Paulo: Loyola, 2002.

[5] Lumen Gentium, 40

[6] Ver Ex 22, 30; Lv 11, 44; 19, 2.