Os efeitos do sacrifício de Cristo

Mons. João S. Clá Dias, EP

Afirma São Tomás ter o homem necessidade do sacrifício por três motivos: para obter a remissão dos pecados, a graça necessária à santificação e a união perfeita do espírito com Deus, o que se verificará, sobretudo, na glória eterna.[1] O sacrifício de Cristo produziu os efeitos mencionados:

“Ora, tudo isso chegou até nós mediante a humanidade de Cristo. Em primeiro lugar, porque os nossos pecados foram apagados: ‘Foi entregue pelos nossos pecados’, diz a Carta aos Romanos. Em segundo lugar, porque por ele recebemos a graça que nos salva: ‘Ele se tornou causa de salvação eterna para todos aqueles que lhe obedecem’, diz a Carta aos Hebreus. Em terceiro lugar, por ele alcançamos a perfeição da glória, como nos diz a Carta aos Hebreus: ‘Temos confiança, pelo sangue de Jesus, de entrar no santuário’, isto é, na glória celeste”.[2]

Assim, ao Se encarnar o Verbo e assumir a natureza humana, pode enquanto homem ser o mediador sumamente agradável a Deus. Por Seu sacerdócio, por Sua oferenda como vítima de expiação, sela com Seu Sangue a nova e definitiva aliança, da qual todas as anteriores eram uma mera figura: “Jesus se tornou o fiador de uma aliança melhor” (Hb 7, 22). É diante deste mistério de amor com o qual se opera nossa redenção, que o Apóstolo exclama: “Tal é precisamente o sacerdote que nos convinha: santo, inocente, sem mancha, separado dos pecadores e elevado acima dos céus” (Hb 7, 26). Para São Tomás, essas cinco características de Cristo sacerdote marcam a diferença entre o novo sacerdócio e o da Lei Antiga, o qual era figurativo daquele que viria.

Com efeito, explica o Aquinate,[3] Jesus, no respeitante à santidade “reunia as perfeitas condições”, porque “foi consagrado a Deus desde o início de Sua concepção: ‘Por isso mesmo, o Santo que há de nascer de Ti será chamado Filho de Deus’” (Lc 1, 35); Sua inocência foi suma, “visto que Ele não cometeu pecado”; não teve mancha, como muito bem é simbolizado pelo cordeiro sem defeito da Antiga Lei (Êx 12, 5); “foi de maneira absoluta a peccatoribus segregatus — separado dos pecadores”, pois embora tenha vivido entre eles, jamais trilhou suas vias (cf. Sb 2, 15); e, por fim, “está sentado à direita da majestade de Deus” (Hb 1, 3), ou seja, acima de todas as criaturas celestes; “n’Ele a natureza humana é sublimada”, e havendo Se sentado à direita de Deus (cf. Hb 1, 3), “é um sacerdote extremamente adequado”.

Em Cristo é eliminado tudo quanto era imperfeito no sacerdócio do Antigo Testamento. A Lei constituía no sacerdócio homens frágeis e de vida breve (cf. Sb 9, 5) que deviam, com frequência, oferecer sacrifícios por seus próprios pecados e pelos do povo (cf. Lv 16, 5-7), enquanto que “contra a Sabedoria, o mal não prevalece” (Sb 7, 30), pois Cristo não teve de oferecer por Si,[4] devido à sua inocência e santidade. “O Seu único sacrifício bastou para apagar os pecados de todo o gênero humano”.[5]


[1] Cf. S Th III, q. 22, a. 2.

[2] S Th III, q. 22, a. 2, resp.

[3] Super Heb. cap. 7, lec. 4.

[4] “A prefiguração não se pode equiparar à verdade. Por isso, o sacerdócio prefigurativo da antiga lei não podia atingir um grau tal de perfeição que não precisasse mais do sacrifício de satisfação. Ora, Cristo não teve essa necessidade; portanto, a razão não é a mesma para ambos. É o que diz o Apóstolo: ‘A lei estabeleceu, como sacerdotes, homens sujeitos à fraqueza, mas a palavra do juramento, posterior à lei, estabeleceu o Filho perfeito para sempre’(Hb 7,28)” (S Th III q. 22, a. 4, ad 3).

[5] Super Heb. cap. 7, lec. 4.