A obrigação de guardar o segredo

Pe. Caio Newton Fonseca, EP

Por direito natural, de si, há obrigação de guardar, de não revelar qualquer espécie de segredos. Porém, esta obrigatoriedade admite graus.

O segredo natural em coisa grave obriga de si sub gravi et ex iustitia. Por isso quem extorquiu de outrem um segredo, por via dolosa ou culposa, está obrigado a reparar todo o dano, seja com relação à fama lesada, seja com relação a eventuais danos patrimoniais, posto que estes danos fossem previstos pelo menos em confuso.

Assim, revelar ou divulgar um segredo natural é, por si, pecado grave.

O segredo prometido obriga como qualquer promessa. A gravidade e a obrigatoriedade se deduzem do ânimo com que foi feita a promessa e da extensão das obrigações que se quis assumir. Portanto, revelar um segredo meramente prometido, por si, ordinariamente não obriga senão sub levi. Porém, conforme o caso, pode chegar a ser grave.

O segredo confiado obriga, por justiça e por si, sub gravi, seja porque baseado num contrato ou num quase-contrato, seja porque ordinariamente é de notável interesse para o bem público que seja fielmente mantido. Portanto, obriga mais gravemente do que o segredo natural e o segredo prometido.

Como foi dito, a obrigação dos diversos segredos é diversa. Como regra geral, pode-se considerar que o segredo obriga segundo a quantidade do dano que se faz injustamente ou ao bem público ou ao bem privado, consequente à violação. (Cf. PRÜMMER-MÜNCH, op. cit., II, pp. 177-179; GUZZETTI, in Enciclopedia Cattolica, XI, col. 255).

O dever moral como raiz do direito

Diác. Jorge Filipe, EPnouvelle1

Em S. Tomás, o direito é uma ordenação ou exigência de perfeição do homem na convivência social. Essa ordenação dada, é eminente em maior ou menor grau segundo se trate de direitos naturais ou de direitos positivos, em maior ou menor dependência dos naturais[1]. Ao falar da lei natural ele descreve o seu efeito formal – o direito natural – como uma “inclinação natural ao acto e fim devidos”[2]. O aquinate faz corresponder a ordem das inclinações naturais à ordem dos preceitos da lei natural e dos consequentes deveres naturais. Essa ordenação ou inclinação constitutiva do direito dá-se em grau máximo na lei e direito naturais. Portanto, o acto justo, definidor da virtude da justiça é dar a cada um o que é seu, ou seja, aquilo que a sua perfeição exige ou necessita para o desenvolvimento da vida em sociedade, plasmados na lei natural em ordem à sociedade, e na lei humana de acordo com aquela[3].

Em termos de uma raiz metafísica dos direitos humanos, para Rodríguez o direito não é uma faculdade, nem uma realidade formalmente moral – honesta ou pecaminosa – mas uma ordenação que relaciona essencialmente o homem livre à sua perfeição sociopolítica, conforme a lei natural de convivência – no caso do direito natural – e as determinações da lei positiva – no caso do direito positivo. Nessa ordem de ideias, o direito natural é a potência ou faculdade volitiva do homem enquanto ordenada ou referida naturalmente àqueles bens que lhe são devidos ou seus, no seu comportamento sociopolítico, segundo os ditames de sindérese. Daí decorre o direito positivo que é a mesma faculdade volitiva do homem enquanto revestida de poder proveniente da autoridade – da potestas. Exercer correctamente a liberdade enquanto princípio e sujeito de acções e hábitos morais, é a autêntica vontade livre do homem[4]. Dentro dessa liberdade, o direito – ius subiectivum – constitui o fundamento da ordem da justiça, o justoiustum obiectivum -, concepção onde reside o fundamento último dos direitos humanos.

 


[1] Ibid.. p. 211. “Por isso é que o direito de um, uma vez que funda o correlativo dever do outro, está, por sua vez, fundado na exigência dada, obrigação ou necessidade mais ou menos natural de auto-aperfeiçoar-se com o exercício das suas funções, pelas quais é responsável perante Deus, autor da natureza individual e social do homem e das suas inclinações naturais”.

[2] AQUINO. S. Th. I-II. Q. 91. a.2. p. 531.

[3] RODRÍGUEZ, Estudios de antropología teológica, Op. Cit. p. 212-214. A razão pela qual há vários preceitos da lei natural é a mesma razão porque há vários bens e cada um desses bens deve ser desejado conforme o que o que a recta razão indicar. Agora, entre esses bens, há alguns a que o homem chega de forma imediata e outros que só são encontrados através de um processo lento de apreensão daquele bem, sendo que a inclinação natural é o prumo que indica a obrigação ou não de os buscar. Assim, conclui S. Tomás que como o bem tem natureza de fim e o mal do contrário, segue-se que tudo aquilo a que o homem se sente naturalmente inclinado, a razão apreende como uma coisa boa e que, portanto, deve ser procurado, sendo que o contrário o apreende como mau, devendo ser por isso evitado. Assim se entende que a ordem dos preceitos da lei natural seja correlata à ordem das inclinações naturais. (Cfr. AQUINO. S. Th. I-II. Q. 94. a.2. p. 562-563).

[4] Ibid., p. 217-218.