O desejo de conhecer no homem

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Dartagnan Alves de Oliveira Souza, EP 

O desejo de conhecer o que está além das aparências materiais leva o homem, enquanto todo, com todas as suas capacidades e inclinações, à procura de um Ser Superior capaz de criar e sustentar todas as coisas, sendo, portanto, Causa e explicação de tudo.

 

 

Desejo do Absoluto

Ao investigar a natureza pela simples razão natural, o homem é levado a encontrar a verdade,[1] esse é o seu objetivo quando busca as razões e causas das coisas. Entretanto, essa busca recai sobre um Ordenador universal — não um demiurgo simplesmente —, mas um Provedor e Sustentador de todas as coisas, no qual se encontra o modelo de bondade e beleza em seu máximo grau.

Jolivet,[2] ao tratar da religião natural, diz que, como efeito das inclinações naturais, o ser humano tende a procurar a verdade no Ser que a possui em grau absoluto. Assim, seguindo essa tendência, ele sente no íntimo de seu ser uma atração para o bem e para o belo que o conduz a encontrar em Deus o exemplo e fonte da Bondade e da Beleza.

Corrêa de Oliveira afirma que o homem inocente, por meio do maravilhamento com a natureza criada, sente em si uma tendência que o arrasta a contemplar o Absoluto: “À medida que vai procurando o maravilhoso, de etapa em etapa, o inocente afina as exigências de sua alma até chegar ao Ser que é o píncaro, a cúpula de toda a ordem do ser, autor da Criação, perfeitíssimo, infinito, absoluto, eterno”.[3]

Vias para conhecer o Criador

A busca sedenta de uma causa primeira para a origem do Universo, presente em todos os tempos, converge para determinadas vias pelas quais o homem, analisando e argumentando, pode encontrar o ponto de partida da Criação. Esse Universo pode ser considerado materialmente em duas partes essenciais: seres irracionais e seres racionais. A primeira serve como via de acesso para que a segunda a utilize nas cogitações transcendentes acerca do Universo.

As vias para se ascender ao conhecimento do Criador têm seu ponto de partida na Criação, no mundo material, captável pelos sentidos externos. Dessa maneira, os seres racionais podem, por meio de argumentos convincentes, chegar a ortodoxas certezas que afirmam a existência de um Ser Superior a todos os demais, pelo fato de ser necessário, enquanto os demais são contingentes,[4] pois necessitam de uma sustentação que não emana da essência de seus próprios seres,[5] mas dAquele que possui em si a causa de seu próprio existir.[6]

Detendo-se o homem por alguns instantes, breves que sejam, na contemplação, por exemplo, de um panorama montanhoso banhado pelos últimos raios do sol que declina no horizonte, no qual o céu parece oscular a terra, normalmente tenderia a maravilhar-se diante do espetáculo. Vendo cores e formas feéricas, ele se sentiria atraído e, poderíamos dizer, quase que arrastado a refletir sobre o que aquele ambiente paradisíaco transmite ao intelecto ou ao sentimento humano. É a ocasião onde o homem, vendo e admirando os efeitos, procura a Causa.[7]

Da beleza à Beleza

As belezas contidas no Universo nos falam de uma Beleza maior, não mutável, mas da qual emanam todas as demais belezas (relativas), sujeitas à mudança.[8] Essas belezas mutáveis são apenas reflexos de uma matriz de Beleza de onde se origina esse transcendental.[9]

Santo Agostinho em um de seus sermões, tratando sobre a beleza, diz:

Interroga pulchritudinem terrae, interroga pulchritudinem maris, interroga pulchritudinem dilatati et diffusi aeris, interroga pulchritudinem coeli, interroga ordinem siderum, interroga solem fulgore suo diem clarificantem, interroga lunam splendore subsequentis noctis tenebras temperantem, interroga animalia quae moventur in aquis, quae morantur in terris, quae volitant in aere [] interroga ista, Respondent tibi omnia: Ecce vide, pulchra sumus. Pulchritudo eorum, confessio eorum. Ista pulchra mutabilia quis fecit, nisi incommutabilis pulcher?[10]

 

Por meio dos atrativos bons, belos e verdadeiros encontrados na natureza material que nos rodeia a todo momento, podemos nos elevar Àquele que é propriamente o Bem, o Belo e a Verdade por excelência.

A respeito da beleza Platão já falara em seu tempo. Para ele, o princípio de uma ascensão à ideia divina de Beleza tem como ponto de partida o amor. É por meio do amor que o homem poderá contemplar as criaturas corpóreas e dar um passo rumo à beleza moral. Atingindo essa beleza posta nos costumes, o homem poderá ascender aos belos ensinamentos — que outra coisa não é, senão a beleza intelectual — para assim chegar à consideração da ideia de Beleza em si mesma — a Beleza enquanto tal — da qual as demais belezas particulares não são senão mera participação.[11] Assim sendo, segundo esse filósofo, o homem ascende como que a graus que o levam a encontrar e a conhecer, paulatinamente, belezas superiores, até chegar à Beleza em si mesma, que é incriada.[12]

Essa ideia, exposta no Banquete, nos mostra de forma claríssima o que Platão pensava sobre a beleza. Encontramos nesse pensamento a conceitualização da ideia do amor vinculada com a ideia de beleza; para ele, é por meio do amor que o filósofo chegará a uma ciência verdadeira (a contemplação da Beleza em si mesma). Platão atribuirá à ideia de Beleza qualificativos “divinos”. O próprio ser humano, ao entrar em contato com ela, poderá haurir essa “divinização”. Ele chega a afirmar que toda participação de beleza contida no Universo tem como modelo essa Beleza “inmutable, que no nace ni perece, autosuficiente, simple, incorpórea, divina y que diviniza al hombre que la posee…”.[13]

Esse pensamento platônico é uma primeira ideia, ainda não nítida, a respeito da relação da beleza por participação com a Beleza subsistente. Claro está que o pensamento em torno da beleza, em todos os seus graus e formas, foi-se desenvolvendo à medida que o próprio ser humano a foi contemplando.

 

 

OLIVEIRA SOUZA, Dartagnan.  Pulchrum: Caminho para o Absoluto? in: LUMEN VERITATIS. São Paulo: Associação Colégio Arautos do Evangelho. n. 8, jul-set 2009. p. 84 – 87.

 

 

 

 


[1] STORK, Ricardo Yepes; ECHEVARRÍA, Javier Aranguren. Fundamentos de antropologia: um ideal da excelência humana. Tradução de Patrícia Carol Dwyer. São Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia e Ciência “Raimundo Lúlio”, 2005. p. 151.

[2] JOLIVET, Régis. Tratado de Filosofia II: Psicologia. 2. ed. Tradução de Gerardo Dantas Barretto. Rio de Janeiro: Livraria Agir Editôra, 1967. p. 328.

[3] CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Primeiro olhar e inocência. Obra póstuma, em preparação. Parte II, cap. 3, 6.

[4] G. P. Manuel de Filosofia: Resumido e adaptado do “Cours de Philosophie” de C. Lahr. 4. ed. Porto: Livraria Apostolado da Imprensa, 1948. p. 742.

[5] MOLINARO, Aniceto. Metafísica: curso sistemático. Tradução de João Paixão Netto e Roque Frangiotti. São Paulo: Paulus, 2002. p. 62.

[6] JOLIVET, Régis. Tratado de Filosofia III: Metafísica. 2. ed. Tradução de Maria da Glória Pereira Pinto Alcure. Rio de Janeiro: Livraria Agir Editora, 1972. p. 362.

[7] S. Th. I, q.2, a.1.

[8] JOLIVET, Tratado de Filosofia III: Metafísica, Op. Cit., p. 260.

[9] BRUYNE, Edgar de. L’Esthétique du Moyen Age. Louvain: Éditions de L’Institut Supérieur de Philosophie, 1947. p. 10.

[10] SANCTUS AUGUSTINUS, Sermo 241, 2. “Interroga a beleza da terra, interroga a beleza do mar, interroga a beleza do ar dilatado e difuso, interroga a beleza do céu, interroga o ritmo ordenado dos astros; interroga ao sol, que ilumina o dia com fulgor; interroga a lua, que suaviza com seu resplendor a obscuridade da noite que segue ao dia; interroga aos animais que se movem nas águas, que habitam a terra e que voam no ar […] Interroga todas essas realidades. Todas elas te responderão: Olha-nos, somos belas. Sua beleza é um hino (confissão) de louvor. Quem fez essas coisas belas, ainda que mutáveis, senão a própria Beleza imutável?” (Tradução pessoal).

[11] PLATÃO. Fédon, XLIX, 100. Citado por MANDOLFO, Rodolfo. O pensamento antigo: História da Filosofia Greco-Romana I. 2. ed. Tradução de Lycurgo Gomes da Motta. São Paulo: Editora Mestre Jou, 1966. p. 13.

[12] PLATÃO. O banquete. Citado por FRAILE, Guillermo, O. P. Historia de la filosofía I: Grecia y Roma. 5. ed. Madrid: La Editorial Catolica, S. A., 1982. p. 354-355.

[13] Ibid., p. 326-327. “…imutável, que não nasce e nem morre, auto-suficiente, simples, incorpórea, divina e que diviniza ao homem que a possui…” (Tradução pessoal).

Edith Stein y su visión de la filosofía de la historia

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Diác. Diego Cubides Umba, EP

            En los primeros años de sus estudios universitarios en Breslau, Edith recuerda una serie de disertaciones de compañeros caídos en el frente y tiene la sensación de pertenecer a una generación hace tiempo desaparecida, preguntándose cómo es que aún vive: 

En general son dos cosas que mantienen en pie mi energía: el deseo de ver qué va a ser de Europa, y la esperanza de hacer algo para la filosofía. De momento, se me interpone una espesa niebla, sobre todo en lo referente a la situación política;…pero no puedo desechar la idea de que la historia del mundo tiene un sentido. Qué margen queda aquí abierto a la intervención de cada uno, ésta es una cuestión sobre la que hace tiempo me rompo la cabeza[1] 

            Sus consideraciones alcanzaban no sólo los hechos concretos de la política, sino que Edith también emitía su juicio sobre las personas que en ella actuaban y sobre la influencia que sus opiniones académicas ejercían sobre sus propios pensamientos; con la finura propia de mujer, se fija en los pequeños detalles, haciendo descripciones muy reales:  

El viejo señor Kaufman, un anciano de bellos cabellos blancos y unos ojos azules joviales y radiantes, así como el profesor Zeiekursel, que era bastante joven, pequeño, pero tieso y enérgico, eran políticos nacional liberales. Se sentían orgullosos del nuevo imperio en el que todos habíamos sido educados, pero no había en ello una divinización de la casa reinante, ni estrechamiento causado por el punto de vista prusiano. Se despertó en mí de nuevo mi antiguo gusto por la historia, hasta el punto de que en los primeros semestres llegase a dudar de si no había de  ser ella  el  campo  fundamental de mi trabajo. Este amor por la historia no era un simple sumergirme romántico en el pasado; iba unido estrechamente a los sucesos políticos del presente, como historia que se está haciendo. Ambas cosas produjeron una extraordinaria  y fuerte conciencia de responsabilidad social, un sentimiento a favor de la solidaridad de todos los hombres[2] 

            Este amor por la persona humana y su riqueza individual, reflejada en la variedad de naciones, la mantuvo inmune a las filosofías materialistas de su tiempo que sustentaban una superioridad física de unos hombres sobre otros y que justificaban la violencia con sistemas de gobierno totalitarios. Era el repudio al fundamento doctrinario de lo que más tarde sería conocido como el Nazismo: 

Con la misma fuerza que rechazaba un nacionalismo darwinista*, me adhería al sentido y necesidad, tanto natural como histórica, de estados independientes y pueblos y naciones diferentes. Por ello las concepciones socialistas y otras aspiraciones internacionalistas no ejercieron nunca influencia sobre mí[3]. 

            Ella critica la complexión obtusa del Materialismo y del Positivismo en la ciencia moderna, que impide el vuelo de la inteligencia: 

Por lo demás, a mi modo de ver, religión e historia se aproximan cada vez más, y me parece que los cronistas medievales, que fijaron la historia del mundo entre el pecado original y el juicio final, eran más sagaces que los modernos especialistas, para quienes, a partir de hechos científicamente comprobados, se ha perdido el sentido de la historia[4]. 

            Stein rechazaba la postura positivista respecto a la exagerada valoración de la técnica y la ciencia como medida de la verdad absoluta, ya que para ella era más importante la trascendencia de los hechos, como influencia en la psicología de los pueblos que viven de la idealización de los mismos, y que representan el orgullo de una nación. Todavía faltaban cuatro años para su bautismo y hablando como judía, no tenía una visión parcializada o nacionalista de la historia: ¡qué rectitud de espíritu!

            El pensamiento moderno degradó lo externo de la naturaleza humana, sobrevalorando la acumulación de la riqueza y el poder del conocimiento, sin importar la incompatibilidad con las normas de conducta moral, rompiendo así el concepto de solidaridad y moderación que había imperado en las comunidades medievales. La sociedad moderna capitalista y comunista requería de un contexto que les permitiese imponer su sistema de explotación de la naturaleza y del mismo hombre,  bajo el pretexto del desarrollo industrial y social.

            Edith Stein, con una inteligencia intuitiva, veía en esta forma de pensamiento una mutilación de la integridad del ser humano, a quien ella entendía como un compuesto de cuerpo y espíritu que debía ser asumido en su totalidad.

            La doctrina positivista no daba cabida a otras dimensiones humanas que no tuvieran qué ver con la realidad física y trascendente, propiciando así una autodestrucción ontológica de la humanidad.

            La filósofa carmelita, a través de su ejemplo y su pensamiento, reclama que el ejercicio de la libertad no puede ser entendido sino bajo los parámetros de una responsabilidad tanto individual como colectiva, y no sólo para el presente sino para el futuro, teniendo en cuenta que la incertidumbre es uno de los legados más nefastos que se le heredan a las próximas generaciones.

CUBIDES UMBA, Diego. La metafísica como sabiduría en el alma cristiana de Edith Stein. Universidad Pontificia Bolivariana – Escuela de Teología, Filosofía y Humanidades. Licenciatura Canónica en Filosofía. Medellín, 2009. p. 25-28.


[1] STEIN, Op. Cit., p. 591.  Carta dirigida Roman Ingarden, el 6 de julio de 1917.

[2] Ibid., p. 302.

* Charles R. Darwin (1809-1882). Autor de la teoría revaluada del evolucionismo. El nacionalismo darwinista  propondría una nación formada por gentes de una única raza.

[3] Ibid., p. 302.

[4] Ibid., p. 603.  Carta dirigida a Roman Ingarden, el 12 de febrero de 1918.