Não escolhemos viver, porque haveremos de escolher morrer?

Fe Notre Dame ParisPe. José Victorino de Andrade, EP

A opção fundamental de um católico deve tender sempre a adoptar uma cultura de vida, uma vez que em Deus está a vida em abundância (Jo 10, 10), Jesus morreu para nos libertar do pecado e da morte (Rm 8, 2) e o próprio Jesus identificou-se como “Caminho, Verdade e Vida” (Jo 14, 6). Entretanto, não são apenas motivações de carácter bíblico ou teológico que levam a Igreja a ser a favor da vida. A Fé caminha juntamente com a razão, à semelhança de um pássaro que voa com as duas asas. Por isso, a Filosofia ajuda a tornar a Fé algo bem maior e mais nobre do que a falsa fé, mero sentimento ou obséquio irracional.

Nesta perspectiva, a fuga ao sofrimento, seja no suicídio ou na eutanásia, para um estado no qual se deixa de sofrer, pois se deixa de existir, pode ser analisada sobre duas dinâmicas ou prismas: individual e coletivo. Não é apenas do ponto de vista da sociedade que o homem deve conservar a vida, pois ainda que alguém fosse acidentalmente parar num local desértico, teria obrigações relativamente à sua própria pessoa, de procurar alimento, hidratação, descanso, cultivar o intelecto e a memória, pensar em modos de alerta e resgate, ainda que as possibilidades de salvamento fossem remotas. E não são tão raros os históricos casos de resgatados em semelhantes condições.

Por isso, o suicídio:

— Do ponto de vista individual:

1. Atenta contra os direitos humanos – decálogo da razão humana e fruto do amadurecimento das raízes cristãs Ocidentais –, em que o respeito pela vida, deve também englobar a própria vida;

2. Vai contra os instintos do homem. Enquanto participação da própria natureza animal, ele procura em todas as circunstâncias preservar a vida, sendo capaz até de feitos extraordinários para conservá-la. Ou seja, faz parte do nosso ser, conservar o ser. E isso pode encontrar-se em qualquer animal: torna-se agressivo, defende-se, esconde-se, etc. para não morrer às mãos do caçador ou do predador;

3. A opção pela morte é uma recusa a aceitar que a vida é feita de dificuldades, e sofrimentos, alguns deles até grandes, mas que não se resolvem ou justificam com a aniquilação do próprio ser;

4. É também o abandono a algo que é fundamental na vida de todos: a esperança, e já diz o velho adágio, essa deve ser sempre “a última a morrer”;

5. Devemos estimar-nos e amarmos a nós mesmos, e o suicídio ou a eutanásia é um abandono da justa auto-estima que devemos devotar à nossa pessoa;

6. Em último lugar, poder-se-ia colocar a derrota, ou mesmo a deserção, no momento em que simplesmente se abandona a grande batalha da vida, preferindo a morte, trocando-se o positivo pelo negativo, a coragem pela covardia. Este exemplo já era dado por Platão, na sua Apologia de Sócrates.

*

— Do ponto de vista coletivo, uma vez que vivemos em sociedade:

1. O mau exemplo perante os demais membros da sociedade, de alguém que desistiu de viver;

2. Causa um sofrimento enorme nos outros, sobretudo amigos e familiares. É um egoísmo pensar apenas em si e não no sofrimento causado, quando alguém põe termo à sua existência, abruptamente;

3. Abandona-se a sociedade e a participação nela, seja como membros de uma família, trabalhadores, colaboradores, a amizade, as ideias, a original personalidade estética e intelectual, quantas coisas vão antecipadamente para “debaixo da terra”.

4. Causa prejuízos aos que permanecem, a todos os níveis, não só financeiros, o que seria secundário, mas também morais, pessoais, entre muitos outros.

5. Acarreta consigo aquela peculiar sensação de culpa, o peso de consciência, seja daqueles que não lograram evitar o trágico desfecho, mas sobretudo os cúmplices, que com a morte precoce colaboraram formal ou materialmente.

É semelhante ao corredor que evitou os obstáculos, saindo da pista, pois acharia que seria mais fácil chegar à meta… Enquanto isso, outros permanecem na corrida, pulando os obstáculos, por vezes caindo e voltando a levantar-se, mas a caminho da meta. Que impressão ficará nos espectadores que estão na bancada. Com quem ficarão edificados, com os que saíram da pista, ou com aqueles que, mesmo caindo, se voltam a levantar, e não desistem… Quem receberá a medalha? São Paulo (Fl 3, 14) usa uma metáfora semelhante, para justificar o prêmio, daqueles que se esforçaram por alcançar a meta. Ele mesmo considerou ter chegado ao fim da corrida (2 Tm 4, 7), merecendo a coroa de glória (2 Tm 4, 8).

A vida é um dom gratuito. Quem escolheu existir? Ninguém. É algo que foi dado (por Deus), transmitido (pelos pais). Se recebemos esse bem, sem pedir, porque haveremos de desfazer-nos dele? Não será uma revolta contra aqueles que deram a vida? Não escolhemos viver, porque haveremos de escolher morrer? A vida parece ser um grande dom para nós tomarmos conta, tratarmos bem, com todo o cuidado. Imagine que alguém recebesse uma empresa para gerir. Ele tem de prestar contas ao patrão. Não lhe compete destruir a empresa… pois não foi ele que a criou. Foi-lhe dada. Poderá incendiá-la, arrasá-la, destruí-la… mas não é dele. Quando estiver diante daquele a quem compete de fato, daquele que lhe deu, do senhor a quem pertence… receberá então “o justo salário”.

Uma palavra mais concreta quanto à eutanásia, e um facto. Este último, como dizem os italianos, “si non  è vero, è bene trovato”:

Os médicos fazem o juramento de hipócrates, no início da carreira, o que significa que faz parte da vocação deles promover a vida, e não a morte. A medicina chegou a tais avanços, que, hoje, é possível manter com dignidade o paciente até à morte natural, inclusive com ausência parcial ou total de dor. Ao autor da vida cabe, também ser o autor da morte. Não se aplica aos agentes de saúde abreviar a vida e conceder a morte, pois o trabalho deles é simplesmente diferente do carrasco. E uma vez que já superamos a pena de morte em grande número de nações, por quê darmos um fim aos doentes que, e ainda bem, já não damos nem sequer aos piores entre os criminosos? Não parece nem justo, nem mesmo racional.

Existe um especialista mundial em Ética, cujo nome é preferível omitir, por variadas razões, autor de numerosos e populares livros traduzidos em várias línguas do mundo, muito afamado na internet, que defende a eutanásia, com toda a logorreia. Certo dia, a mãe dele ficou muito doente, acamada e debilitada. Perguntaram-lhe porque ele não a encomendava a uma instituição que pudesse exercer a eutanásia, e abreviar-lhe a vida. Mas isso era para os outros. Ele amava a sua mãe, e a solução drástica ele só dava para quem não fosse mais útil na sociedade. A mãe dele ainda era objecto de algo, talvez o principal: o amor, capaz de vencer o utilitarismo…

A Bioética cristã é a mais preparada para responder ao homem de hoje

106-0639_IMG

Pe. José Victorino de Andrade, EP

O Papa Bento XVI,  na Caritas in Veritate chamava a atenção para o perigo que existe na adopção de uma ética sem um forte compromisso cristão, pois acaba-se por “designar conteúdos muito diversos, chegando-se a fazer passar à sua sombra decisões e opções contrárias à justiça e ao verdadeiro bem do homem” mas é necessário uma ética “amiga da pessoa” (n. 45). Ora, continua ele, a Igreja “tem um contributo próprio e específico para dar, que se funda na criação do homem ‘à imagem de Deus’ (Gn 1, 27), um dado do qual deriva a dignidade inviolável da pessoa humana e também o valor transcendente das normas morais naturais” (n. 45).

O problema com uma dignidade meramente ética é que ela permanece sempre relativa e sujeita a juizos morais em desenvolvimento, instáveis. Torna-se necessário o recurso a uma dignidade humana que seja ontológica, e, portanto, inevitávelmente tendente à metafísica, além de uma dignidade teológica que se fundamente no absoluto, complementando-se ambas.1 Há que prestar atenção, pois quando se faz um apelo à ética, esta não deve consistir num qualquer sistema, vazio ou alienado em conteúdos. Esta questão envolve uma importância que deve estar longe de ser descurada. É perigoso considerá-la um negócio, passar por um jogo de interesses ou mesmo algo passageiro, mas tem de tornar-se um compromisso sério, radicado numa ética original e originária.2

Quando a bioética se funda em qualquer ética, corre-se sempre o risco de atropelar dignidade humana com ideologias impregnadas de utilitarismo, consequencialismo, e processualismo, aliás, várias faces de uma mesma moeda, cunhada inicialmente por Bentham e Mill, baseando em cálculos de felicidade e utilidade para os homens, valorizando o hedonismo, e julgado a bondade ou maldade do acto por sua utilidade, e não pelo facto em si, parecendo repetir o dito maquiavélico de que os fins justificam, ou absolvem os meios,3 desde que a satisfação, no seu geral, seja alcançada.

Não se tardaria a cair em morais populistas como as de Peter Singer, com todos os seus erros perniciosos, pois o homem não tardaria também a ser avaliado segundo esse modelo: assim, aqueles que não possuem uso da razão, quer seja porque não o possuem, ou porque o perderam, deixam de estar incluídas na categoria de pessoas, talvez por não serem úteis…4. Parecem estar assim justificados alguns dos maiores crimes que se cometem hoje contra a dignidade da pessoa.

A Bioética, para ser, de facto, uma ética da vida, terá de ter um referencial que a transcenda. Nós não inventamos a existência, ela é-nos dada, portanto, dom gratuito. Do ponto de vista da vida que recebemos, desse acto de amor de Deus criador, o nosso ponto rector tem necessariamente de se transcender, pois materialmente falando, não fundamenta nem justifica o nosso ser. Um mundo que vira as costas ao seu autor, e que dirige a visão para causas puramente materiais, torna-se incapaz de dar o necessário valor à vida, e ao próprio homem, para relativizá-los.

Escreveu de modo acurado o Cardeal Elio Sgreccia, presidente da Pontifícia Academia para a Vida, que o “silêncio da metafísica”, deu lugar ao relativismo, a uma ética racionalista laica, que não deveria deixar de se confrontar com o absoluto, pois a razão pede ao homem que se confronte com valores humanos e normas éticas cuja origem é transcendental.5 Realmente, uma ética sem qualquer fundamentação teológica ou metafísica está sujeita às frágeis bases do compromisso social.6

Acrescenta o Côn. Jorge Teixeira Cunha, no seu excelente Manual de Bioética, que a falta de confrontação com a evidência metafísica e o Absoluto nos pressupostos desta matéria, leva a um “bater de asas no vazio de uma egolatria sem horizonte”, pois “justificar racionalmente a norma do bem moral” não deve excluir, quanto ao seu juízo, a consideração do pensamento religioso e teológico cristão.7

Vemos, deste modo, que um conúbio entre a ética e a mística é fundamento e base para a vida em plenitude do homem peregrinante nesta terra, dom do Criador, preâmbulo daquela mesma felicidade eterna à qual todos estão chamados. Nas belas palavras do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira:

“Se o nosso fim próprio é conhecer, amar, louvar e servir a Deus, nossa natureza, máxime enquanto elevada à ordem sobrenatural, deve tender inteiramente para este fim. Ou seja, todas as nossas atividades mentais e físicas devem dirigir-se para o conhecimento da verdade e prática do bem. Tanto quanto no Céu, esta finalidade é real na vida terrena, pois nossa natureza se orienta toda para o que será na eternidade. Suas tendências fundamentais já são o que eternamente serão.

E como a vida terrena não pode ser contrária à nossa natureza, segue-se que ela já é de algum modo, a sua substância, no que tem de mais interno, essencial e íntimo, no plano natural como no sobrenatural, a mesma vida de contemplação, amor, louvor e serviço de Deus que teremos no Céu”.8

_____________

1Cf. ALZATE RAMÍREZ, Luis Hernando; OSORIO, Byron. Op. Cit., p. 47; 50-51.

2 “El reto que se plantea para la ética es fundamental. Las posiciones éticas cotidianas  de los cristianos simplemente se confunden con la ética dominante que puede ser una defensa coyuntural de los derechos humanos. O también puede aparecer la iglesia defendiendo un vago humanismo como cualquier Organización no Gubernamental. O se predica un amor a los demás, universalizante y abstracto sin compromiso de la persona. La ética no se reduce a ser un ‘buen negocio’. El recurso al compromiso ético no es cuestión de ‘imagen’ (se puede ser ético para obtener ganancias y estatus) o de estar a la moda, sino de fundamentación y fundamentación en una ética original y originaria. Original por ser propia del cristianismo y originaria pues es fundante de toda acción social en el mundo”. (ARBOLEDA MORA, Carlos. Experiencia y testimonio. Medellín: UPB, 2010. p. 22).

3 Cf. MAQUIAVEL. O Príncipe. Trad. Lívio Xavier. São Paulo: Ediouro, 2005. p. 73.

4 “Niños muy pequeños, débiles mentales, ancianos en demencia y sujetos permanentemente inconscientes no deberían ser considerados personas ni serían, por tanto, sujetos de los derechos básicos que habitualmente adscribimos a las personas. Desde semejante planteamiento tienen cabida el aborto, la eutanasia y todos aquellos males que se ciernen sobre los débiles de la sociedad”. CARRODEGUAS NIETO, Celestino. El concepto de persona a la luz del Vaticano II. In: Lumen Veritatis. São Paulo.  No. 12 (Jul. – Sept., 2010); p. 44.

5 Cf. SGRECCIA, Elio. Manuale de Bioetica. 4. ed. Milão: V&P, 2007. Vol. 1. p. 30.

6 Esta ideia está fundamentada na conferência feita pelo Arcebispo Jean-Louis Bruguès, abordando a Encíclica de João Paulo II Veritatis Splendor, no Seminário São Tomás de Aquino (São Paulo – Brasil) no dia 1 nov. 2010. Ver também o nº 53 do documento.

7 Cf. TEIXEIRA DA CUNHA, Jorge. Bioética Breve. Apelação (Portugal): Paulus, 2002. p. 6.

8 CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. A contemplação terrena, prenúncio da visão beatífica. Em: Revista Dr. Plinio. São Paulo. Ano IV. No. 42 (Set., 2001); p. 21.

Aportes para o discernimento de um autêntico progresso: Da Populorum Progressio à Caritas in Veritate

Diác. José de Andrade, EP

 

 

relo“Hoje o mundo está cheio de convites ao progresso. Ninguém quer ser ‘não progressista’. Trata-se, todavia, de saber em que consiste o verdadeiro progresso”.[1] De acordo com Corrêa de Oliveira, este resume-se “no reto aproveitamento das forças da natureza, segundo a Lei de Deus e a serviço do homem”. Porém, “nem é o progresso material de um povo o elemento capital do progresso cristãmente entendido.” Mas, sobretudo, “no pleno desenvolvimento de todas as suas potências de alma, e na ascensão dos homens rumo à perfeição moral”.[2]

            Conforme o filósofo espanhol contemporâneo Ferrater Mora, o progresso pode considerar-se como um processo ou evolução, porém, onde se incorporam os valores.[3] Estes são fundamentais para um saudável e sustentável desenvolvimento, sem o qual, corre-se o risco de tudo desmoronar, pois não estaria construído sobre solo firme. E que solo mais firme haveria do que a “rocha de Pedro”? De facto, ao longo da história, a Igreja preocupou-se com um pleno desenvolvimento, repleto de valores, servindo-se para isso de uma atenta análise do decorrer dos tempos, munida das escrituras, a fim de servir-se da Palavra de Deus que interpela os homens de todos os tempos.

 

Fundada para estabelecer já neste mundo o reino do céu e não para conquistar um poder terrestre, a Igreja afirma claramente que os dois domínios são distintos, como são soberanos os dois poderes, eclesiástico e civil, cada um na sua ordem. Porém, vivendo na história, deve estar atenta aos sinais dos tempos e interpretá-los à luz do Evangelho. Comungando nas melhores aspirações dos homens e sofrendo de os ver insatisfeitos, deseja ajudá-los a alcançar o pleno desenvolvimento e, por isso, propõe-lhes o que possui como próprio: uma visão global do homem e da humanidade.[4]

 

            Uma superficial consideração do mundo de hoje leva a crer que a Igreja é contra o progresso, tal seria, pois, enquanto tal e na verdadeira acepção da palavra, é uma coisa boa. A este respeito, escreveu Paulo VI em seu último livro, ainda enquanto Cardeal Montini, em 1963:

 

A cristandade não é um obstáculo ao progresso moderno porque não o considera apenas nos seus aspetos técnicos e econômicos, mas no total de seu desenvolvimento. Os bens temporais poderão certamente ajudar o completo desenvolvimento do homem, mas eles não constituem o ideal da perfeição humana ou a essência do progresso social.[5]

 

            O problema com o aparente progresso, este sim, criticado pela Igreja, está no fato de ter vindo acompanhado de uma filosofia de vida que parecia dispensar Deus e confiar na mera técnica, ou no próprio homem, tal como advertiu o então cardeal Ratzinger:

 

Não é a expansão em si das possibilidades técnicas que é má, mas a arrogância iluminista que, em muitos casos, esmagou estruturas desenvolvidas e calcou as almas de homens cujas tradições religiosas e éticas foram postas de parte de forma displicente. O desenraizamento das almas e a destruição de estruturas comunitárias que então ocorreram, são certamente o principal motivo pelo qual a ajuda ao desenvolvimento apenas muito raramente tenha conduzido a resultados positivos.[6]

 

            Thomas S. Kuhn, chegou mesmo a colocar o dedo na ferida e a levantar o problema para onde caminhava a ciência em meados do séc. XX, pois, seu processo parecia partir de estágios primitivos e aparentava não levar a pesquisa para mais perto da verdade ou em direção a algo, o que significava que um número inquietante de problemas poderiam advir.[7]

            Anteriormente, já Kierkegaard alertava que, tornando-se a ciência um modo de vida, então esse seria o modo mais terrível de viver: “encantar todo o mundo e se extasiar com as descobertas e a genialidade, sem, no entanto, [o homem] conseguir compreender-se a si mesmo”.[8]

            No decorrer da 2ª Guerra Mundial, o mundo ocidental fica chocado com as práticas abusivas de médicos nazis que em nome da ciência, cometem as maiores atrocidades contra o ser humano em nome da ciência. Surge então o desenvolvimento de um código ético que se condensa com o nome da Bioética e formula-se aí também a idéia que a ciência não é mais importante que o homem. O progresso técnico deve ser controlado e acompanhar a consciência da humanidade sobre os efeitos que pode ter no mundo e na sociedade para que as novas descobertas e suas aplicações não fiquem sujeitas a todo o tipo de interesses.[9]

            Como o progresso não se reduz a questões científicas, muito pelo contrário, a Populorum Progressio, documento fundamental para o âmbito deste estudo, trouxe-nos importantes aportes: “Combater a miséria e lutar contra a injustiça, é promover não só o bem-estar mas também o progresso humano e espiritual de todos e, portanto, o bem comum da humanidade”.[10] Esta forma de progresso integral vem muito bem delineado no recente Compêndio de Doutrina Social da Igreja:

 

A humanidade compreende cada vez mais claramente estar ligada por um único destino que requer uma comum assunção de responsabilidades, inspirada em um humanismo integral e solidário: vê que esta unidade de destino é freqüentemente condicionada e até mesmo imposta pela técnica ou pela economia e adverte a necessidade de uma maior consciência moral, que oriente o caminho comum. Estupecfatos pelas multíplices inovações tecnológicas, os homens do nosso tempo desejam ardentemente que o progresso seja votado ao verdadeiro bem da humanidade de hoje e de amanhã. (n. 6)

 

 

            O remédio para os males e um falso progresso estão na caridade, porém, caridade na Verdade, ou seja, em Jesus Cristo. Se d’Ele não se tivesse afastado o homem, não teria o progresso sofrido tal desvio. Ao voltar-se para Deus, e valorizar o amor conforme o mandamento novo trazido por Jesus, o progresso se desenvencilhará de suas deturpações e produzirá os frutos mais excelentes. Tal como afirma Bento XVI na sua mais recente encíclica:

 

A partilha dos bens e recursos, da qual deriva o autêntico desenvolvimento, não é assegurada pelo simples progresso técnico e por meras relações de conveniência, mas pelo potencial de amor que vence o mal com o bem (cf. Rm 12, 21) e abre à reciprocidade das consciências e das liberdades. (Caritas in Veritate, n. 7)

VICTORINO DE ANDRADE, José. Aportes para o discernimento de um autêntico progresso: Da Populorum Progressio à Caritas in Veritate. Projecto de Mestrado em Teologia Moral. UPB. Escuela de Teología, filosofía y humanidades. Facultad de Teología, 2009. p. 3-5.


[1] JOÃO PAULO II. Visita pastoral à paróquia romana de São Clemente. Domingo, 2 de Dezembro de 1979. in: <www.vatican.va>.

[2] CORRÊA DE OLIVEIRA. Plinio. RCR. in: Catolicismo, nº100, 1959. p. 31.

[3] FERRATER MORA, José. Dicionário de Filosofia. Tradução de António José Massano e Manuel Palmeirim. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1978. p. 231.

[4] Populorum Progressio, n. 13.

[5] MONTINI, Giovanni Battista. The Christian in the Material World. Baltimore: Helicon, 1964. (tradução minha).

[6] RATZINGER, Joseph. Fé, Verdade, Tolerância. Traduções UCEDITORA: Lisboa, 2007. P. 71

[7] Cf. REALE, Giovanni. História da Filosofia: Do romanismo até nossos dias. V. 3. São Paulo: Paulus, 1991. p. 1046.

[8] Idem, p. 250.

[9] Cf. SÓNIA. Ética: Emergências Médicas – 2º ano. in: Bioética. Doc. Prefeitura de Araquara, 1997. p. 1.

[10] Populorum Progressio, n. 76.